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Luzinha

A minha mãe chamou-me para ir lá fora, a correr, ver um ‘carreirinho de luzes’ que não eram estrelas nem uma ‘iluminação de Natal’ porque ia muito alta. - Vem aqui! D epressa! - Gritava ela. Fui, claro, mas já não vi luzinhas a brilhar e disse-lhe que eram satélites. - Ali! -  Apontava. - Se calhar é dos óculos, não vejo nada... Devem ser os satélites Há dias, vi umas publicações, nas redes sociais, acerca dos comboios de satélites do Elon Musk e pareceu-me uma hipótese plausível, qualquer outra é menos provável e mais preocupante. Uma nave extraterrestre pode significar o fim da humanidade tal como ela é, não se perdendo muito já que estamos cada vez mais perto de esgotar todas as possibilidades de evolução positiva que tínhamos, era chato. E, uma alucinação implicaria recorrer a mais uma especialidade do Serviço Nacional de Saúde (SNS) que, como se sabe, não vai bem. Satélites, contentamo-nos com a possibilidade de serem satélites que nos levou à certeza de que tenho que troc

A Implicação

  -Vámoláver, desconfiar, desconfiava de qualquer coisa, mas não era de nada disto… No início, o Padrinho contactava-me amiúde, contava-me as suas conquistas e eu pedia-lhe ajuda para resolver coisas complicadas que me apareciam no serviço,  mas depois eu mudei-me para o palácio e o Padrinho passou a contactar o meu chefe de gabinete, combinavam coisas, só sabia dele quando o meu chefe de gabinete me dizia com ar gozão "o Padrinho mandou-te um abraço". Pensei em telefonar-lhe, confrontá-lo, mas não queria parecer implicativo.  Éramos amigos de casa, as nossas famílias faziam férias juntas, não percebia aquele afastamento. Custava-me. Também nunca confrontei o meu chefe de gabinete, não sou um desses patrões implicativos … confiava nele e dava-lhe liberdade. Quando o Padrinho começou a aparecer no palácio, com outras pessoas para reunir com o meu chefe de gabinete, fazia por me cruzar com ele e ele nada. Nunca me apresentou às pessoas com quem depois ia almoçar…  Sentia-me tri

alma.na.que

A minha mãe guarda os Almanaques dos Missionários da Boa Nova no armário da casa-de-banho. Tem uma colecção muito expressiva, o mais antigo é de 2000. Não sei como começou, mas entretanto já me sinto super capaz de cuidar da horta que não tenho.  Em Novembro, plante alhos! Nem toda a gente gosta de alhos, eu gosto de alhos, são úteis. Estes Almanaques têm o propósito de patrocinar as missões desenvolvidas pela congregação, em África. Contam a vida dos santos, informam as estações, os dias e as luas, como tratar da horta e têm algumas páginas dedicadas a um 'humor de caserna' a que a minha mãe não resiste. Volta e meia diz apontando na direcção da casa-de-banho 'num daqueles Almanaques, que estão ali...' e todos sabem que vai repetir uma das piadas que vem como nova mais ou menos de três em três anos.  Antigamente, as revistas dos missionários eram vendidas por uma velhinha, ligeiramente corcunda, que nos salvava muito baixinho com um 'louvado seja nosso senhor Jesus

Cinema

'Gosto de cinema', é uma afirmação como outra qualquer, desprovida da profundidade que o outro normalmente espera. – Ai, sim? Gostas de cinema. Então e porquê? – O outro é chato! Não me identifico muito com ele, deixa-me desconfortável. Eu ficaria só pelo – Gostas? Que bom! – Mas o outro quer sempre mais. Não é que eu ligue muito ao outro, mas como recebi uns meses de assinatura da plataforma de streaming Filmin  ao assinar o jornal Público num breve acesso de loucura, resolvi que ia tirar notas de todos os filmes que visse nessa plataforma. Tenho o telemóvel cheio de notas.  Não caí na tentação de atribuir estrelinhas como os críticos do Público que devem tirar um certo prazer disso – Scorsese? Uma estrelinha! Assim percebem que sou muito exigente e não me vergo aos grandes… Acho que procurava só ser  uma espectadora mais emancipada , não esperava erudição, mas também não sei se o que devia esperar era o que à distancia encontrei. Segue-se um exemplo.   Ida (2013) by 

No caminho dos outros

  Já não há burros que nos carreguem no percurso até à Quinta de Vila Nova.  Seriam úteis, apesar de o caminho não ser muito longo é demasiado longo para o pouco que estamos habituados a andar. Seriam tão úteis como devem ter sido ao Jacinto quando percorreu pela primeira vez o caminho que hoje tem o seu nome e pelo mesmo motivo, o sermos demasiado urbanos para isto. ‘Aregos’, lembro-me de em miúdos esperarmos ansiosos pela próxima estação, prontos a exibir as habilidades de leitura e acharmos muita piada aos nomes, cada um mais estranho do que o outro. Os nomes das estações na direção inversa não suscitavam tanta gargalhada. Caldas de Aregos, Caldas de Canaveses…gostava quando me diziam que ali eram as caldas. As termas remetiam-me para senhoras de vestidos longos, chapéus e sombrinhas... Influencia das séries inglesas que passavam na televisão. Sente-se a falta de gente nas ruas. As poucas que se vêem entretêm-se nos quintais, tentam contrariar a seca. - Ao preço a que as coisas

Nobel

  Mais uma vez, o Nobel da Literatura, não foi para Lobo Antunes ou, para outro português. Nem vai enquanto não houver uma aposta governativa semelhante à que fazem com o patrocínio a grandes obras de arte que são só isso, grandes, e com a internacionalização do cinema. Sendo que no caso do Turismo é incompreensível que não façam mais promoção ou eventos literários já que não deve existir um único município sem uma Casa-Museu ou centro de interpretação dedicado a um escritor. Os portugueses são frequentemente acusados de não se interessarem por literatura, mas os portugueses adoram os seus escritores e usufruem deles na medida em que eles lhes são oferecidos. Mesmo que o que lhes ofereçam seja só o orgulho na conterraneidade. O nome da rua, a estátua do largo, o túmulo e a casa-museu que visitam amiúde ao longo da escolaridade obrigatória...  Depois, os poucos eventos locais destinam-se aos doutores e políticos que vão a convite e não são muito abertos à diferença, ao empregado fabr